08 junho 2008

A Falta que a Maturidade Faz


Estou com trinta e um anos. E nestes trinta e um anos aprendi muita coisa. E adquiri a capacidade de perceber as oportunidades que eu perdi ao longo da vida por imaturidade. Não me culpo, não me martirizo. Mas lamento algumas oportunidades as quais não aproveitei.

Atualmente, sonho em aprender duas coisas: tocar bandolim e costurar alfaiataria. Fico vendo pessoas tocando bandolim lindamente e me lembrando da minha infância. Vovô tocava bandolim. Vovô tocava muitos instrumentos musicais e todos ele tocava muito bem. Ele tinha este dom. Mas o que mais me encantava era o bandolim. Principalmente quando ele tocava a valsa que fez pra mim e que eu nem me lembro como ela é mais. Aí eu fico triste porque poderia ter pedido meu avô pra me ensinar a tocar bandolim, a ler partitura. E ele teria me ensinado com prazer. Além de eu ter aprendido a tocar meu bandolim, eu teria passado muito mais tempo com meu avô. E teria sido um tempo mágico. Mas eu nunca pedi. Eu nunca sequer manifestei minha vontade de aprender a tocar bandolim simplesmente porque esta vontade não existia. Eu não percebia que estava diante de uma oportunidade única. Mas também não podia perceber. Eu era criança. E meu avô não podia imaginar que eu no futuro poderia sonhar em aprender a tocar bandolim, ainda que isto custasse minhas longas e lindas unhas vermelhas.

A lembrança do bandolim inevitavelmente conduz à lembrança de meu avô e no tempo em que morávamos em Diamantina. Sinceramente, nem sei se nós morávamos lá, mas vivíamos lá. Isto é verdade. E eu me pego na lembrança de um quarto com uma mesa grande, pedaços de papel pardo, réguas, esquadros, lápis 2B e tesouras. Havia também linhas, agulhas, botões, aviamentos. Vovó costurava. Lembro-me de minha mãe contando que suas roupas eram feitas por vovó. Ou adaptadas. Houvera uma época em que meus avós passaram muitas dificuldades e as roupas eram sempre maiores, precisavam ser ajustadas, passavam dos mais velhos para os mais novos. Não vivemos mais esta realidade. A vida vem sendo cada vez mais generosa com minha família. Mas eu gostaria de fazer eu mesma as minhas roupas. Só que eu não pedi minha avó pra me ensinar a costurar... então ela não me ensinou. E agora não pode me ensinar mais. Meu avô também costurava. Mas não eram vestidos, eram ternos, calças, coletes. E para ele eu também não pedi. Enfim, eu poderia ter aprendido a costurar tudo que hoje eu gostaria de vestir. Mas eu não sei costurar. E não sei por que não pedi a meus avós para me ensinarem, embora tenha certeza de que eles o fariam com o maior carinho. Não é que eu não desse valor ao trabalho deles. Eu simplesmente não tinha condições, naquela época, de perceber a beleza daquele trabalho. Não tinha maturidade o suficiente para compreender que aprender a costurar seria muito mais que uma máquina de costura, tecidos, linhas e tesouras. Minha idade não permitia ver além, não permitia perceber o quão importante seria aquela convivência.

Enfim, a vida é assim. Não tive maturidade para aprender no momento em que a oportunidade batia à minha porta. Tenho certeza de que perdi momentos incríveis com pessoas queridas. Lastimo não ter tido esta percepção antes. Mas acredito que conseguir perceber estas coisas hoje já me faz uma pessoa melhor e me dá a certeza de que ainda perderei muitas outras oportunidades se eu não passar a dividir melhor meu tempo e a minha atenção. E esta certeza faz com que eu preste mais atenção em coisas que nem sempre são facilmente perceptíveis.


Larissa tem certeza de que ainda aprenderá a tocar bandolim e a costurar. E tem mais certeza ainda de que há muito o que se aprender, com pessoas queridas que estão muito mais próximas do que imagina.
(*) Este post é dedicado ao Marco, blogueiro assíduo, que tem sido uma espécie de muso rsrs

11 comentários:

Marco disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Marco disse...

Ah, eu tô que não me "caibo" em mim! hehehe! Que honra ser "muso", ainda mais de uma blogueira que me inspira tanto e de quem eu sou fã incondicional desde que li pela primeira um post seu.

Um dia estava eu falando com minha primeira namorada adolescente no msn, quando eu vi que a frase dela era "Sobre homens e cachorros, quem conhece?" Tratava-se de uma frase escrita não sei por quem e que ela queria saber a frase inteira. Então fui eu procurar na internet pra ver se achava. E achei várias coisas e um texto em um blog chamado SO HARDT cujo título era: "Sobre Homens e Cachorros". Parei para ler sobre o que se tratava e quando percebi, já tinha lido vários posts teus e tinha esquecido minha amiga me chamando no msn por meia hora:) A frase que ela queria era: "Quanto mais eu conheço os homens mais eu gosto do meu cachorro".

Desde então eu te leio todo dia, mesmo que nem todo dia você escreva. E se alguém pode ser inspiração para alguém, está é você, visto que eu te descobri primeiro:))))

Amei, Larissa! Beijos

(Ah, essa história do teu avô me inspirou para um post que ainda hoje vai está lá no Errantes.)

Maria Augusta disse...

Larissa, vim te agradecer pela visita ao Jardin, e vejo que você continua escrevendo divinamente bem. Verdade que se pudéssemos viver de novo faríamos tudo diferente. Ri quando li sobre a costura, pois minha mãe costurava (e criava, lembro que ela inventava os modelos, que eu achava "os mais bonitos da escola") e eu tinha o sagrado direito de enfiar as agulhas da máquina...Depois de adulta entrei em um curso de Corte e Costura aqui na França, mas na correria do dia-a-dia não deu para continuar.
Apesar de não ter aprendido com seus avós, eles te passaram o gosto e um dia você aprenderá a arte deles, tenho certeza.
Um beijo e boa semana.

Anônimo disse...

Dois desejos que eu jamais imaginaria virar um post tão bacana. Mérito de quem tem competência, é claro!!! rs...
Vc me fez lembrar de mim na adolescência. Qdo eu costurava minhas próprias roupas (mini saia era fácil, fácil!) só pra nçao ter que vestir as breguices dos vestidos bordados que minha tia me dava de presente! rs... olha só que coisa. o texto mexeu tanto comigo que voltei a mil anos atrás!!! rs
Beijo queridona.

Camila Hardt disse...

Eu tinha uns 10 anos quando falei com mamãe que aprendi a jogar xadrez. E ela disse "Você aprendeu como se mexem as peças. Saber jogar é diferente, seu avô por exemplo sabe jogar xadrez." E um dia eu pedi, "Vovô, me ensina jogar xadrez? Mas eu já sei mexer as peças." Ele não me disse que "saber jogar" dependia de prática. Ao invés disso, abriu o cofre, onde ficavam guardadas suas coisas mais preciosas (o baralho, a boca de piranha, os doces de amendoim, o tabuleiro de xadrez e outros tesouros que a gente sempre queria ver saírem lá de dentro), pegou o tabuleiro e, com a maior calma do mundo, me sentou em uma das pernas, colocou o tabuleiro na minha frente e, armando possíveis jogadas, dizia "Olha, se acontecer isso, repara nessa peça e faz isso". Quanto tempo durou a aula? Não sei. 10 minutos? 3 horas? Não faço idéia, mas sei que acabou quando eu cansei e fui brincar. E ele, embora soubesse que 2 minutos depois eu não lembraria de nada, gastou comigo o tempo que eu quis, porque ele já tinha vivido quase 80 anos e ele sim sabia o quanto era importante aquela convivência. De fato, hoje mal me lembro como se mexem as peças. Mas me lembro exatamente da paciência de alguém em me ensinar uma coisa que eu não ia aprender, sabendo que ia deixar pra sempre a sensação que se tem quando se tem certeza que se é amada.
Essa semana tou mais sensível a esse assunto. Fez 4 anos que a gente está sem ele, e eu até hoje acho que foi uma injustiça eu só ter ido a Brasília e visto um baralho do JK pra comprar depois que não tinha mais quem presentear.

Lunna Guedes disse...

A vida é cheia de pequenas singularidades e a que mais me fascina é a possibilidade de recomeçar sempre e de nos desafiar através daqueles desejos (estranhos ou não) que despertam na pele e vagam solto pela alma.
Abraços meus

Mia disse...

Quando eu era pequena sabia tocar partituras no piano e tocava flauta de ouvido... deve ter sido nesse tempo que meus dedos esticaram e ficaram a fineza que se apresenta hoje... tinham calos e tudo. Dançava balé e fazia roupinhas pras minhas bonecas. Interessante como o tempo leva tudo quando a gente se distancia. Hoje só toco "parabéns pra você", não danço praticamente nada além de balançar os dedos compridos e nems ei por onde andam as bonecas... é o que dizem... "life is full of possibilities". =)
Voltei também, amiga! ^.^

=**

Anônimo disse...

Oi, Larissa! Vim agradecer pela visita e dizer que adorei os eu post. Perdi um tio e um primo nas ultimas semanas e eu tb passei a pensar que poderia ter aproveito mais com eles. Curtido mais os momentos. Dizem que a gente só dá valor quando perde. Verdade, não é?
Bom, um grande beijo pra vc e até a próxima.

Angel disse...

Ei Lari!

Tubo bem?
Texto ótimo. Também me sinto assim às vezes com relação ao meu pai. Serve para aproveitarmos mais aqueles que amamos.

Beijos!

Luma Rosa disse...

Tanta coisa que passa por nossa vida e que não damos o devido valor à época. Mas além da vontade de aprender, está a valorização que dá pelos trabalhos que seus avós exerciam, mais ainda, inconscientemente está valorizando as suas raízes. Deve ser uma ótima neta!! Boa semana! Beijus

Puzzo disse...

Lastimo o tempo que perdi por julgar desnecessária minha presença.

Lastimo os passeios de fins de semana em que me ausentei por julga-los monotonos.

Ê imaturo eu fui.