14 fevereiro 2008

Contra o Abuso Sexual Infantil e Adolescente. Em Defesa da Inocência e da Puberdade Saudável.


Eu queria realmente entender o que é que se passa com uma pessoa que tem coragem de abusar da inocência e ingenuidade de uma criança. Pra mim, não existe covardia maior. Infelizmente, a cada dia que passa os jornais nos surpreendem com notícias cada vez mais assustadoras sobre abuso sexual infantil e adolescente. E a covardia anda espalhada pra todo lado, onde menos se imagina.

Tenho um amigo que está com a úlcera quase perfurada, pensando seriamente em vender tudo, morar na praia com a família e abrir uma barraca de côco. Ele conta que enquanto foi advogado, nunca escolheu cliente, nunca disse não a uma causa. Não por falta de escrúpulos, mas sim porque havia feito um juramento e que não cabia a ele julgar –dizia – mas sim garantir que o cliente dele tivesse um processo dentro da lei. Assim, ele acabou defendendo (e dizem que brilhantemente) também casos de violência sexual e, algumas vezes, contra crianças e adolescentes. Sim, dava nojo, mas ele fazia um trabalho “técnico”, falava. Mas quando se tratava de pré-adolescentes e adolescentes, ele acabava se traindo e deixando a gente perceber que ele não acreditava em sedução de adolescente de fins do século XX e do século XXI.

Só que chegou uma hora que ele cansou da advocacia criminal, decidiu que ia passar pro lado de lá da mesa e acabou virando promotor de justiça. A vida tem seus mistérios: ele acabou parando numa vara criminal onde havia muitos casos de estupro e atentado ao pudor. Mas continuava não acreditando muito em abuso sexual de adolescentes quando o caso era de presunção legal. Falava que uma menina de 13 anos dos dias de hoje sabe exatamente o que está fazendo quando decide se relacionar com um homem.

Só que ele teve filhas, gêmeas, duas menininhas lindas, por sinal e um dia acabou me confessando que, na medida em que as meninas iam crescendo, o medo dele ia aumentando. No início, ele temia porque elas eram muito pequenas e criança aceita picolé, chocolate e chiclete de qualquer um se os pais não estão atentos. As meninas pareciam bebês de comercial de fralda de tão lindas e acabavam chamando muita atenção das pessoas. Então ele ficava sempre atento com estranhos que se aproximavam delas quando ele e a mulher estavam vigiando as duas de longe.

Aí, continuou meu amigo, as meninas cresceram, foram começando a virar mocinhas e eu comecei a perceber que, aos quinze anos, embora elas realmente já estivessem com o corpo em um estágio relativamente avançado de maturidade, esta maturidade não se refletia nas ações delas. E era isso que dava medo nele. As meninas, já mocinhas de quinze anos, se achavam as mulheres mais poderosas da face da Terra. Achavam que já tinham condição de decidir a direção da vida delas e brigavam muito com os pais por causa disso, atitude tipicamente adolescente. E algumas vezes elas saíram escondido e voltaram tarde pra casa, enquanto ele e a mulher se desesperavam ligando pros pais dos colegas, indo nos lugares onde elas poderiam estar e rezando pedindo a Deus que nada de mal lhes acontecesse. Ele disse que não conseguia parar de pensar nos casos que ele via diariamente no trabalho e sofria só de pensar que elas podiam ser vítimas de violência.

Ele havia se convencido de que eu não estava brincando: um adolescente, menino ou menina, se acha o dono do mundo, mas não é; e mesmo que tenha domínio sobre seu corpo, que saiba tecnicamente o que está fazendo, não tem maturidade, nem discernimento pra pensar nas conseqüências das suas decisões, independentemente de quais sejam estas decisões.

Esta conversa com meu amigo me marcou muito. Eu tenho, e sempre tive uma repulsa, um horror, especiais quando o assunto é violência sexual. Se envolve criança e adolescente então, pior ainda. Só que vejo pessoas saindo em defesa dos idosos (sim, creiam-me, há os que praticam violência sexual contra idosos), das mulheres adultas, das crianças, dos homossexuais, mas quando se trata de abuso sexual adolescente (presumido por lei), principalmente se a vítima é menina, sempre há questionamento antes, durante e depois da defesa se o caso era realmente de abuso ou se houvera consentimento.

Ouço pessoas dizendo que atualmente as meninas de doze anos já são mulheres feitas. Aonde? Porque o que eu vejo, é que, hoje, realmente as meninas de doze anos estão com o corpo bastante desenvolvido se compararmos com as meninas de doze anos de trinta anos atrás, vestem-se como se fossem adultas, agem como se fossem adultas, mas não estão definitivamente preparadas emocionalmente para assumir os riscos e conseqüências de uma vida adulta. Cadê as meninas-mulheres-feitas? Não existem, creio eu. Correm pra casa chorando quando alguma coisa ou alguém as magoa e pedem o colo dos pais. E quem se aproveita da inexperiência adolescente, pela qual todos nós passamos, pra se satisfazer é um covarde que usa uma imagem que ele mesmo sabe não representar a realidade como desculpa esfarrapada e vergonhosa pra abusar sexualmente de quem ainda não tem discernimento pra tomar determinadas decisões.

É por isso que eu saio em defesa das vítimas de abuso sexual, mas principalmente dos adolescentes, porque justamente a confusão hormonal pela qual eles naturalmente passam os torna mais vulneráveis e mais difíceis de proteger de quem só quer se satisfazer às custas da fragilidade deles.

Larissa aderiu à blogagem coletiva contra a pedofilia na última hora porque só agora ficou sabendo do movimento. Já denunciou e vai continuar denunciando sempre, mesmo que isto nunca acabe e mesmo que às vezes sinta que sua luta é inglória, porque a proteção de uma única criança ou adolescente já vai valer esta briga toda.

13 fevereiro 2008

Loucura, Esquizofrenia e Mau Caratismo: Tudo em Cena de Uma Só Vez

Usa-se muito a palavra loucura quando se acha que alguém agiu de forma que o senso comum não recomendaria – tipo sair gritando as pessoas pela rua – ou quando se teve coragem de soltar as amarras e, por exemplo, não se aceitou emprego num país de desempregados, terminou-se um namoro morno e se mudou pra outro país sem nem conhecer a língua. Há várias outras palavras que poderiam ser empregadas ao invés de louco. Quem grita as pessoas pela rua ou está bêbado ou desesperado ou surpreso ou é sem educação mesmo. Tecnicamente não se caracteriza loucura. Quem recusa um emprego, larga o namoro mais ou menos e se arrisca em outro país pode ser corajoso, arrojado, irresponsável, depende do ponto de vista de quem está avaliando. Mas tecnicamente também não se caracteriza loucura. Loucura é a qualidade ou o estado do louco, que pode ser aquele que perdeu a razão, o que está apaixonado, o brincalhão ou o furioso. Mas a loucura não é um estado necessariamente permanente. Quem nunca fez loucuras? Quem nunca se apaixonou, nunca brincou ou nunca se enfureceu? Eu, graças a Deus, tenho meus momentos de loucura. Saio às vezes na rua cantando em alto e bom som, dou gargalhadas por nada, me enfureço com buracos na estrada, sou uma mulher apaixonada. Louco é quem nunca cometeu uma loucura.

Mas há os “loucos” patológicos, a quem a medicina e a psicologia dão outros nomes. Dentre eles, há os esquizofrênicos. Esquizofrenia, de origem grega, significa mente dividida; a dissociação que existe entre o pensamento da pessoa e a realidade a sua volta. Esquizofrênicos criam um mundo paralelo à partir de um fato real. Conseguem elaborar conspirações fantásticas, exercem um papel importantíssimo nas tais conspirações, são o centro das atenções, porém, de uma realidade que só existe na cabeça deles. Quem não se lembra de John Nash, matemático norte-americano vencedor do prêmio Nobel de Economia? Nash teve uma vida sofrida e provocou muito sofrimento para sua família, mas nunca prejudicou ninguém. Não que eu tenha conhecimento, já que biografias autorizadas e filmes-homenagem não costumam contar os podres dos protagonistas. Mas há os esquizofrênicos não diagnosticados e estes sim podem provocar muito dano às pessoas à sua volta. Mesmo que todos percebam sua “loucura”, e dêem gargalhadas de suas teorias conspiratórias, sempre há alguém prejudicado pelas manifestações do esquizofrênico. E se para muitos os atos do esquizofrênico são motivo de riso, pro alvo da esquizofrenia não há nada de engraçado. No início, dá tristeza; depois dá pena. Esta loucura é doença, não tem cura e nem sempre o tratamento dá resultado. Definitivamente, não faz rir, nem cantar. Mas traz prejuízo, no mínimo emocional. E amigos meus estão passando por isto agora por terem convivido com um esquizofrênico não diagnosticado.

Há ainda quem chame – equivocadamente, na minha opinião – os portadores de transtorno bipolar também de “loucos” patológicos. Que a bipolaridade é um distúrbio, não duvido. Mas daí a ser louco patológico acho que tem uma distância. Convivo com algumas pessoas que têm a bipolaridade dignosticada (embora também seja difícil o diagnóstico, já que muitas patologias têm características em comum com a bipolaridade e a esquizofrenia) e todos eles seguem o tratamento. Nada impede que exerçam suas atividades, ninguém nem diria que são portadoras de sofrimento mental. Porém, os bipolares não diagnosticados podem trazer sérios problemas para si e para os outros. A alternância de humor pode levar o bipolar a agir de forma como nunca agiria e ninguém entende porque num dia a pessoa está eufórica e no outro está deprimida, chorando no canto da sala. Como o humor é inconstante, as pessoas taxam o bipolar de louco ou dizem “fulano é assim mesmo, instável, esquece que ele te xingou à toa, que gritou com você, releve, seja um espírito elevado”.

E a trouxa aqui foi relevando, relevando, relevando. Chegou a pensar que estava convivendo com um portador de transtorno bipolar mas, ao final, percebeu que alternância de humor, instabilidade, doença, loucura e mau caratismo não se confundem. E o que eu fui relevando, relevando, relevando, sempre após desculpas esfarrapadas de que “não estou numa boa fase...”, “precisamos pensar no grupo e não individualmente”, “ah, vai ter que dar!”, “o que é que você espera de mim às 15:00h!”, “preciso ir ao médico, não estou bem...” foi se mostrando um eficaz instrumento para manipular situações e pessoas até conseguir o que queria. Esquizofrenia, talvez? Também não. Mas sim um exemplo de mau caratismo. Aí você começa a analisar fatos passados e fica chocada: como é que não percebeu isto antes? Era tão evidente a prepotência, o autoritarismo, o orgulho, a soberba, o egoísmo, o individualismo e tantos outros ismos que não quero nunca ter como predicados!

E agora, mais esta! Achei que tinha ficado livre do mau caráter (e azar o dele se ele também é bipolar ou esquizofrênico), mas não. Ele volta à cena por meio de subterfúgios. Precisa de mim, mas o orgulho e a soberba, embora não o impeçam de ver isto nitidamente, o impedem de fazer uma simples ligação, enviar um e mail e resolver o problema. Na realidade, nem precisa. Pode resolver sozinho. Mas pra isso gastaria tempo e o tempo do mau caráter vale mais que o dos outros. Além do mais, o mau caráter autoritário gosta de mandar, gosta de sentir que manda e os outros obedecem. Então usou outra pessoa pra me mandar fazer uma coisa que eu não tenho obrigação nenhuma de fazer por conhecer o vínculo que me une a esta pessoa. Mas desta vez o mau caráter vai quebrar a cara. Porque a pessoa que ele acha que eu respeito acima de muita coisa, por quem eu até faria o que foi indiretamente ordenado sem nem questionar, também vem, há algum tempo, se mostrando, de forma mais inteligente, lenta e sutil, um outro mau caráter. E pessoas de mau caráter não são dignas de respeito, nem de consideração. Vai dizer de obediência!!

Espere sentado, mau caráter, o cumprimento de sua ordem. Porque ordens, quando já não há mais hierarquia, são cumpridas como favor, por respeito, não por temor ou sentimento de dívida. E eu não vou te fazer este favor não porque eu não te respeite ou não te tema mais, como você pensa e gosta de pensar. Eu não vou te fazer este favor é porque de fato eu nunca te temi, muito menos te respeitei!!


Larissa está chocada com os absurdos de que as pessoas são capazes, como inventar coisas e provocar prejuízo às pessoas, amoralmente ou inventar a mesma coisa, por mau caratismo, imoralmente. E ainda dizem que a louca é ela, que canta em voz alta na rua e no chuveiro!!

11 fevereiro 2008

Acordei bem, dormi com barulho

Acordei bem

Hoje (ontem, dia 10) eu acordei com o telefone azucrinando minha vida. Sabe quando você tá sonhando que conseguiu pegar aquele brigadeiro gigante (que sempre evaporava nas suas mãos) e tá enfiando ele inteiro na boca e acorda antes de sentir o gosto? Foi assim que eu acordei.

- Alô!, falei, mau humorada.

- Oi, Larissa, é o Genilson (*). Te acordei?

- Ahnnn... mais ou menos, Genilson (constrangida ao ver que já era quase meio-dia); faz o seguinte: vou acabar de acordar, lavar a cara e te ligo daqui a pouco, pode ser?

- Não precisa, só liguei pra te contar que eu passei no vestibular da Federal pra Medicina.

Sabe quando você está sonhando e justamente quando o tubarão vai te pegar e te fazer em pedacinhos e mastigar com aqueles dentes afiadíssimos você acorda nos braços do Wolverine de sunguinha vermelha? Acabei de acordar assim!!

- Ai, que bênção, Genilson!! Vamos sair pra comemorar!! Parabéns!!

Sabe, toda vitória é especial, mas a do Genilson é mais ainda. Conheci o Genilson no serviço voluntário. Eu era voluntária e ele era detento. Estava cumprindo pena por tráfico de drogas e roubo. Era viciado em cocaína. Largou a droga. Cumpriu a pena. Nesse meio tempo, voltou a estudar. E agora vai fazer Medicina!! Que orgulho de ter incentivado meu amigo – sim, ele se tornou um amigo – a mudar de vida!!

Levantei, tomei um banho e fiquei cantarolando até ouvir uma que me deixou passada.

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Dormi Com Esse Barulho

Fui prum churrasco e lá, naquela difícil vida de piscina, cerveja e picanha com os amigos, ouvi um comentário de que o pai do fulano não aceitava que ele fosse amigo do Pedro (*) porque o Pedro era preto. Meus olhos quase saltaram das órbitas. Primeiro porque o Pedro tem que tomar muito sol na moleira pra poder ser tecnicamente chamado de preto. Segundo porque ainda que ele fosse preto igual jabuticaba isso não é critério pra definir quais são as boas amizades. Terceiro: puta que pariu que eu pensava que isso já tinha virado coisa de novela!! Quando externei meu puta que pariu, ouvi do Pedro:

- Lalá, se eu te contar que isso existe e muito você não vai acreditar. Outro dia minha sobrinha chegou lá em casa chorando aos cântaros. Perguntamos pra ela o que tinha acontecido e ela respondeu que não queria mais ser pretinha (eles a chamam carinhosamente de Pretinha, a menina é linda, tem cinco anos, parece uma indiazinha, cabelo lisinho, preto, uma tetéia), que queria ser branquinha, ter olhos azuis e cabelo lourinho de cachos, igual princesa pra ela poder ir à festinha de aniversário da colega de turma.

Desta vez meus olhos não saíram das órbitas, mas ficaram vidrados. Que tipo de gente é esta que faz isto com uma criança?!! A mãe da tal coleguinha de sala não convidou a sobrinha do Pedro pra festinha porque a menina na concepção daltônica dela é preta. E como é que se explica pra uma criança que é melhor nem conviver com gente que acha que a cor da pele – ou a religião, nacionalidade, orientação sexual, e por aí vai – não servem de critério pra se verificar nada de nada? Como é que se explica pra uma criança de cinco anos que o mundo ainda tá coalhado de espírito de porco? Fui dormir ontem pensando na menininha. Isto aconteceu ontem e até agora não consegui parar de pensar nisso. Como é que pode, meu Deus?


(*) Nomes fictícios pra preservar a identidade dos amigos.

Larissa está muito, muito feliz pela conquista do seu amigo e sabe que ele ainda vai enfrentar muitos preconceitos pelos erros que cometeu. Mas está muito triste por saber que uma criança já está sentindo na pele um preconceito que achava estar acabando.